Que os fins nos recomecem
- Daliane Azevedo P. Guimarães

- 24 de ago. de 2023
- 3 min de leitura

Mais um tempo de mudança, em alguma parte da minha vida e de novo, sigo aqui no meu divã preferido. A escrita é vital pra mim e quem me conhece, vez ou outra recebe minha chuva de palavras. Para preencher minhas nuvens, alguns afetos em forma de livros. Acabo de ler: "A gente mira no amor e acerta na solidão" - de Ana Suy.
O título tem tanto dentro dele e vai nos recheando de possibilidades interpretativas, ao ponto de quase nos empurrar, por pura curiosidade. Parece-nos contraditório a disposição de amar e uma solidão cultivada neste mesmo processo.
Caberiam a maternidade, os relacionamentos amorosos, as relações de trabalho, às amizades que encontramos pelo caminho, os (des)encontros todos à sombra de qualquer parada... Acredito que nossa capacidade de amar os outros, se desenvolve de maneira saudável quando o amar-se acontece simultaneamente. Arrisco dizer que aqueles que lidam bem com a sua própria presença, são as pessoas mais incríveis ou que descobriram o tesouro do existir.
A discordância encontrada nas curvas que fazemos, traz um requinte de vida, nos ajuda a peneirar o que realmente nos importa E DEIXAR MORRER AS INDELICADEZAS. Solitude! Como chegar até você sem primeiro trilhar o caminho inverso?
"Estar com o outro, sem demandar nada do outro" - é estado de graça. Presença com respeito. Direito de ser quem se quer. Quantos se projetam na vida alheia, mascaram desejos, comparam-se, diminuem seus talentos, cuidam dos outros - sem cuidar de si. São tantos e tão variados caminhantes que encontrar-se parece remar contra uma maré de movimentos contemporâneos.
Quem sabe de nós, é mesmo o amor e a solidão, a soma das minhas horas comigo, na ação do verbo "amar" em seu maior ponto: amor próprio. Próprio de silêncio, próprio de reconexão, próprio de reciprocidade (porque ela precisa existir), cálculo de como somos com os outros, e qual versão sobra pra mim mesma.
Quando o outro é ele mesmo e nós conseguimos ser nós mesmos, algo parece ficar mais leve. Ana Suy diz que Amar é verbo que se conjuga no gerúndio, e eu acrescento que a solidão é sinônimo de apreciação. Aproveitar o tempo para me humanizar.
Vez ou outra me pego no barulho de companheiros de jornada, totalmente aversa ao tricô que acontece - e ali também, percebo que na minha humanidade posso aliviar a humanidade alheia, mantendo-me isenta de querer mudar o rumo da conversa, o ritmo que dançam ou o que escolhem murmurar.
Amamos aquilo que nos interroga? Ou amamos o conforto da aglomeração sem canção? Que prefiramos amar e apreciar-nos cantando. Amor contém solidão. E se ainda não encontrou a porção de cada um, perceba que não há contrários entre eles.
Amor nos concede um pouco mais, solidão nos ajuda a elaborar este limite. Sair e voltar, introduzir-se na elaboração diária da vida e, por consequência, realinhar cavernas iluminadas pela sua luz interna.
A minha luz das últimas semanas passou por manutenção, e o universo me acendeu. Amor e solidão nos balançam também na profissão. Falo de duas (ex)alunas, que trouxeram - cada uma a seu modo, o que signifiquei pra elas, como professora.
Em mim, tenho guardado todo o carinho derramado trazido pela adolescente Jéssica e o olhar atento de Inês - seu "querer saber" era lindo! E confirmo que o meu traço de compromisso só coube na realidade delas, porque aprendi a amar a solidão do estudo "dos outros", fazendo um curso intensivo sobre mim mesma primeiro.
E continuo a aprender, sem dispensar o bom trato com o amor e a solidão!
Saber-me sozinha é também saber-me com o outro. Que os fins, nos recomecem SEMPRE!




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