Quero ser gentil
- Daliane Azevedo P. Guimarães

- 28 de jul. de 2023
- 2 min de leitura
Atualizado: 27 de set. de 2023

Num dia comum, no fim de um compromisso de trabalho, uma bela jovem me olha e pergunta meu nome; eu respondo ainda sem reconhecê-la e ela me diz ter sido minha aluna. Pergunto-lhe em que escola foi - porque já tenho bons anos de sala de aula e, para minha surpresa: Escola Infantil Passo a Passo. Eu ministrava Redação! E ela confessa que gostava muito. Pra mim, isto foi uma gota de afeto num dia cansativo.
Era a sua infância e o meu primeiro emprego. Não conseguiria mensurar o quanto foi fácil ou difícil aquele tempo. Lidar com crianças e despertar nelas o gosto pela escrita foi de uma coragem - como em poucas situações. Hoje, um pouco mais de 20 anos depois, posso vasculhar os meus baús de (in)seguranças profissionais, e fazer surgir: uma coleção de capítulos incríveis - que me deram a oportunidade da condução da escrita. E antes de qualquer abertura para os outros, ela serviu a mim.
Outras escolas, outras realidades, outros alunos... e em nenhuma delas desconsiderei o contato dos olhos, a leitura que começa pequena, o incentivo à escrita e o treino. Nada fica bom, se a gente não insistir. Dons são presentes, mas sem ensaios, resiliência, cotidiano, eles beiram a inutilidade.
Hoje estou com Língua Portuguesa e ITRDH (Interculturalidade, Religião e Direitos humanos) do 9º ano, numa rede pública - cheia de todas as vulnerabilidades referentes à Educação Básica e gratuita do nosso Brasil, mas ainda há a tentativa - com sucessos pontuais, de acender nos meus alunos, o gosto pela linguagem e pela saúde mental - que as palavras bem ditas e bem escritas, desabafadas num papel (ou com alguém), e colhidas nos textos, trazem pra nós.
Ler a vida, a rotina, as dificuldades, o que nos falta, o que nos sobra, quem temos, quem somos, o que os nossos olhos assistem, o que guardamos das pessoas, quem sou pra mim, o que as palavras me agregam... tudo corre como rio e deságua num livro qualquer, numa persona, numa carta resposta, na coragem de não desistir, num ponto qualquer de lucidez, num desabafo louco e possível ou num pedaço de silêncio entre um oi e o reconhecimento do que já fui para alguém, de quem "estou" no presente e como é minha costura de futuro.
Por mais flores em dias difíceis; porque nada supera a gentileza!
Texto em homenagem à Julyane Dias. A ex- aluna, hoje psicóloga e amante da "linguagem" - citada no texto.




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