Traços na parede
- Daliane Azevedo P. Guimarães

- 5 de jan.
- 3 min de leitura

Os traços do desenho de Iza na parede da sala me mostram o quanto ela cresceu e o quanto precisamos de ‘espaço’ para nos construir como pessoas e pra descobrir aquela parte que fazemos bem – no treino despretensioso. Não é apenas dom, herança, brilho, é desenvolvimento e o ressoar interno do querer.
O ano de 2024 se foi, com o peso e as delícias de um ano que jamais sairá da memória. Sabemos ser apenas números, mas para a alma nada tem precisão temporal, pois tem arranjos, transformações, adequações e possíveis aprendizados – e tudo isso não é mensurado. Tivemos vários sinais do movimento da terra começando por bagunçar o que temos por dentro e o que pensamos “ter” por fora.
O ano em que os amigos nos salvaram de nós mesmos. Os especiais nos lembram de quem somos e enxergam quem podemos ser. Presente e futuro que se misturam, porque sozinhos não haveria equilíbrio e abraços. Até para ter solitude “de qualidade”, é necessário que experimentemos o estar junto que desejamos ou não. Complexo e desafiador. A qualidade da relação com a nossa ‘crueza’ manifesta-se na qualidade das relações com os outros e nas escolhas do que queremos, com quem queremos e quem caminha conosco.
Na vida é preciso compatibilidade, pois o amor/amizade se nutrem no terreno da segurança. Não é perfeição, é descoberta do que eu consigo ou posso aprender a tolerar, em mim e nos outros. No entanto, a maturidade vai também trazendo e levando pessoas. Ora sutilmente, ora repentinamente. Não falo de morte física, ou somente dela, falo de renascimentos constantes. Morremos em vários pontos da caminhada e acreditar ser necessário renascer – nos conecta a verdadeira razão de estar aqui.
Ontem foi o dia de assistir: Mufasa – o rei leão, no cinema e na companhia de “amigos”. Daquelas combinações importantes da existência. Conexão que não se explica, mas se admira e se alonga. E como todo filme, aqui em casa gera análises profundas, piadas e metáforas suaves por muito tempo em nossas próximas conversas. Nunca é só um filme.
“Os olhos jamais se esquecem do que o coração viu” – Mufasa não tinha o desejo de ser rei, nem pertencia a uma linhagem que lhe indicasse o destino, mas o que enfrentou, a sua resiliência, a quem ele se aliou, onde ele se aninhou – fez toda a sua história ser uma grande lição. É prestar atenção nos recados da vida, apropriar-se de nossas virtudes e assumir o poder de usá-las, desenhar as nossas texturas, inventar perfumes... e perceber quem se aproxima por afeição ou com descaso. Aceitação e tristeza são senhoras, mas nada tem com burrice ou desistência.
Continuaremos quebrados por longos anos de construção, pelo inconsciente ainda carregado de sombras, mas diante dos meus olhos, nas plantas da minha casa, nos dias mais difíceis – quando só tínhamos um pouco de água para oferecer a elas, ainda foi e é possível ver mais verde do que folhas secas. Não é a inexistência delas, é a certeza da inconstância. “Tudo muda o tempo todo no mundo... como uma onda no mar!” – porém, a vida se mostra muda – silenciosa e broto. Não há como ser o mesmo, agarrado, sem espaço no canteiro, a menos que se queira esconder do sol, da chuva, das curvas, de si, do fechar os olhos e do ouvido atento.
A rispidez humana continua me magoando, mas vou aprendendo a enxergar “os meus” por ressonâncias e porque há coisas que desembaçam a visão. Quais são essas coisas pra você?
A minha principal coisa é continuar conjugando os verbos no gerúndio. Escrevendo, amando, chorando, viajando, plantando amigos, fazendo-me perguntas, realizando pequenos e grandes movimentos, retornando, buscando espaços solitários e outros conjugados – falando de verbo e falando de junção, para que eu continue a crer – na minha permanência aqui, nas pistas pelo caminho, na pessoa que consigo ser hoje.
Faça a sua tessitura (organização dos sons musicais) ou a sua tecitura (organização dos fios que se cruzam no tear) - não importa em que lugar acontece a sua trilha, só continue procurando a sua Milele (um paraíso terrestre onde a grama é alta e a água flui, um lugar de esperança e continuidade de vida)





Cada detalhe é muito especial😍
Parabéns dali são perfeitas as suas crônicas😍👏👏👏
Impressionante como a sua escrita nos faz viajar, amiga. Obrigada por compartilhar conosco suas reflexões que mexem com nossa alma. Amo-te! Laylla ❤️😘👏👏👏